Artigo publicado no Jornal do Centro (27 de setembro de 2019)
Em 18 de junho de 2018 escrevia nestas páginas: “Tenho notado, nos últimos tempos, uns quantos movimentos na sociedade que me parecem excessivos, quase fundamentalistas.”. O artigo referia em concreto uma situação no âmbito da igualdade de género, mas o que não falta por aí são outras (e à escala global). Retomo o tema, agora com duas (supostas) atitudes racistas no espaço de três dias. Começou com uma foto com quase 20 anos do primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, em que aparece mascarado de Aladino, numa festa cujo tema era “As mil e uma noites”. Tendo escurecido o tom de pele, é agora acusado de “racista” (por um adversário político). Ridículo. Depois foi um inofensivo tweet de Bernardo Silva dirigido, em inequívoco tom de brincadeira, ao colega de equipa (e amigo!) Benjamim Mendy (de raça negra), que até alinhou na mesma, mas que indignou a Kick It Out, uma organização que se diz combater o racismo, ao ponto de ter apresentado queixa do jogador. Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, racismo é 1. Teoria que defende a superioridade de um grupo sobre outros, baseada num conceito de raça, preconizando, particularmente, a separação destes dentro de um país (segregação racial) ou mesmo visando o extermínio de uma minoria; ou 2. Atitude hostil ou discriminatória em relação a um grupo de pessoas com características diferentes, nomeadamente etnia, religião, cultura, etc.. Alguém no seu perfeito juízo pode achar que o tweet de Bernardo Silva e a reação de Mendy se enquadram em alguma destas hipóteses?! Eu diria que é exatamente o contrário: revelam grande amizade e cumplicidade. O que tenho constatado ultimamente é que muitos (ditos) defensores de uma qualquer causa, quase sempre baseada na tolerância, são os mais intolerantes. Fundamentalistas. ***** Duas semanas depois de publicado este artigo, leio numa revista de projeção nacional um outro ("A desvairada parvoíce do politicamente correcto", in Visão, 09-10-2019) na mesma linha e focando os mesmos exemplos, por alguém muito mais abalizado (Professor Doutor José Brissos-Lino).
0 Comments
Artigo publicado no Jornal do Centro (30 de agosto de 2019)
O jornal online “Observador” publicou na passada segunda-feira uma interessante entrevista com o professor José Pacheco que, há 40 anos, esteve na origem de (pode dizer-se) uma revolução na forma de ensinar (Escola Básica da Ponte, concelho de Santo Tirso). Seguramente polémica, deve obrigar a refletir, a parar para pensar. Com o devido respeito, deixo meia dúzia de extratos dessa entrevista: - “O centro [da aprendizagem] não é o aluno, mas sim a relação entre professor e estudante. (…) A aprendizagem só acontece quando há criação de vínculos. Se quando estudava teve um professor de quem não gostou, não aprendeu nada. É na qualidade da relação pedagógica que se aprende ou não se aprende. (…) Já fui ingénuo e, durante 30 anos, acreditei que o centro fosse o aluno. Só os burros é que não mudam de ideias.”. - “Um professor não transmite aquilo que diz, transmite aquilo que é.”. - “Não há dificuldades de aprendizagem, há dificuldades de ensinagem [‘Ensino’ é o ato de ensinar, ‘ensinagem’ é o processo pelo qual ocorre a aprendizagem]. Não há alunos com necessidades educativas especiais, há professores com necessidades educativas especiais. Não há alunos deficientes, há práticas deficientes.”. - “Estamos no século XXI, não sei se já entenderam… Como costumo dizer, temos alunos do século XXI, professores do século XX a trabalhar como no século XIX. É um escândalo.”. - “Um teste nada avalia, ou melhor, avalia a capacidade de retenção na memória de curto prazo de determinada informação para debitar num papel e esquecer.”. - (ainda acerca das provas de avaliação e da “necessidade” de colocar os alunos afastados uns dos outros): “(É) agir no pressuposto de que os alunos são desonestos. É transmitir valores errados, da mentira, da desconfiança, da corrupção.”.
Artigo publicado no Jornal do Centro (2 de agosto de 2019)
(Nota prévia: por razões que se prendem com a paginação e impressão do jornal, este artigo (como os restantes, por regra, foi redigido e enviado para o Jornal do Centro no dia 28 de julho de 2019; nos dias que se seguiram o caso que aqui se relata teve desenvolvimentos que reforçam o essencial da opinião manifestada). No final da semana passada o tema principal das notícias foi o caso das golas antifumo e dos kits que foram distribuídos em cerca de 1 600 aldeias ao abrigo do programa “Aldeias Seguras”. O foco das críticas tem-se centrado no facto de as golas serem inflamáveis. Mas isso até é, na minha opinião, o menos relevante. Não é suposto que elas protejam do fogo, mas sim da inalação de fumos, através de um efeito de filtro. Sucede que as ditas golas não têm o devido tratamento anticarbonização para tal e, isso sim, é grave. Mas mais grave ainda é tudo o que parece ter envolvido o negócio, nomeadamente o seguinte: o material foi fornecido por uma empresa do marido de uma autarca do partido no poder, constituída cerca de meio ano antes de ter sido celebrado o contrato, cujo objeto é "turismo de natureza e exploração de parque de campismo e caravanismo"; a Proteção Civil (que escolheu e aprovou os materiais) optou pela consulta prévia a esta e mais quatro empresas: duas do ramo têxtil, uma da área de marketing digital e outra de comércio de eletrodomésticos, as quais não apresentaram sequer propostas para a aquisição das golas (talvez pelo facto de “golas antifumo” não ser propriamente o seu negócio, digo eu); valor de cada um dos contratos (golas: 102 mil euros; kits: 165 mil euros) superior ao limite máximo para este tipo de procedimento (consulta prévia); preço das golas superior ao dobro do preço de mercado. As reações e explicações oficiais que se seguiram, nomeadamente do Ministro da Administração Interna e da Proteção Civil, foram, para dizer o mínimo, lamentáveis. Todo este episódio é triste. Infelizmente, é apenas mais um, semelhante a tantos outros, na sua essência. Haverá esperança?... Ora bolas!...
Artigo publicado no Jornal do Centro (7 de junho de 2019)
Terminou a época futebolística. Como sempre, uns ganham, outros perdem. Este ano pude assistir, no espaço de uma semana, a manifestações de quem soube ganhar, de quem não soube perder e também de quem não soube ganhar. Na hora da vitória no campeonato, o treinador do Benfica teve um discurso invulgar. Invulgarmente bom. Sem os clichés do costume. Saiu do registo habitual, no conteúdo e na forma, de uma forma correta e digna. Soube ganhar. Chegará o momento em que perderá. Aí perceberemos melhor o seu caráter. Já o treinador do Futebol Clube do Porto, perdidos o campeonato e a Taça de Portugal (ambos por culpa própria), mostrou (confirmou) que não sabe perder. Se na final da Taça o argumento que invocou pode servir de atenuante para a sua atitude, o mesmo não acontece relativamente ao que fez no Dragão, no final do jogo com o Benfica onde, no fundo, perdeu o campeonato, quando também deixou de mão estendida um jovem que, disse mais tarde, até passava férias em sua casa. Não soube (não sabe) perder. Mas também pude assistir a uma manifestação de alguém que não sabe ganhar. Foi no último jogo do Tondela, com o Chaves. A meio da primeira parte já o Tondela ganhava por 4-0, resultado que permitiria a manutenção da equipa beirã e a descida de divisão dos transmontanos. Na bancada, a cada golo da sua equipa, a comemoração de um adepto do Tondela resumia-se a “apenas” se dirigir à claque adversária com gritos e gestos insultuosos. Poderia comemorar com manifestações de alegria (como a quase totalidade dos adeptos tondelenses). Mas não. Comemorava com insultos da mais diversa ordem aos apoiantes da equipa opositora. E esteve nisto durante praticamente todo o tempo. Mais preocupado em insultar os opositores do que em apoiar a sua equipa. Porquê? Para quê? Com que necessidade? Com que vantagem?... Não soube ganhar. Para que fique claro: tenho assistido a vários jogos do Tondela em casa e os adeptos são, na sua esmagadora maioria, exatamente o oposto deste. A exceção faz a regra.
Artigo publicado no Jornal do Centro (10 de maio de 2019)
De vez em quando (e ultimamente com mais insistência) fala-se na introdução de uma contribuição a impor às empresas que empregam menos pessoas como forma de suportar o sistema de segurança social. É uma ideia interessante (justa, até) que, na minha opinião, deve ser acompanhada de uma redução das contribuições já pagas pelas empresas mais empregadoras. Na verdade, o atual sistema, em que as empresas contribuem para a segurança social proporcionalmente ao número de pessoas que empregam, acaba por penalizar as empresas que empregam mais pessoas. No fundo, o “simples” facto de empregar pessoas já é, em si mesmo, uma forma de apoiar e contribuir para a segurança social. Cada pessoa empregada representa, no fundo, duas: uma que deixa de necessitar de apoios sociais e outra que passa, ela própria, a contribuir para o sistema, ou seja, para aquelas que precisam desses apoios. Para além de ser um fator de desenvolvimento económico em si mesmo, empregar pessoas constitui, pois, um importante e relevante papel social. O facto de uma empresa ter de contribuir para a segurança social (e num valor significativo) na razão direta do número de pessoas empregadas é, nesse sentido, uma penalização. Emprega mais e mais pessoas? Então contribui mais e mais para a segurança social. Não parece justo, uma vez que ao empregá-las já está a aliviar as necessidades do sistema. Encontrar um modelo em que, ao contrário do atual, quanto menos pessoas uma empresa empregar (tomando em consideração outros fatores, claro), maiores serão as suas contribuições para a segurança social, aliviando a contribuição das empresas mais empregadoras, além de mais justo, poderia ainda constituir um fator de incentivo à contratação e, logo, a menores necessidades do sistema. Resta saber se esta eventual decisão de obrigar as empresas menos empregadoras a contribuir para a segurança social significará um alívio das restantes ou se se manterá a contribuição destas nos moldes atuais. |
Nota préviaIniciei este blogue em janeiro de 2016, na sequência da criação desta página pessoal. Categorias
All
Arquivos
November 2020
|